O código e a mensagem

30 03 2007

O código de barras foi considerado uma das grandes invenções do século XX, leu M. Hermann no jornal. Mais importante do que certas obras literárias, dizia na gazeta. M. Hermann concluiu que as pessoas preferem os códigos às mensagens. Apesar disso continuou a ler diariamente o seu jornal favorito. Dava-lhe mais prazer conhecer a informação do que perceber a semiótica. Quem lhe poderá levar a mal?





Dificuldades do choro

18 03 2007

M.Hermann ao contrário do seu amigo C. Khunz não era, propriamente, aquilo a que se chama uma pessoa emotiva. Muito pelo contrário. Faltavam-lhe características essenciais para o ser. E o ser é, como se sabe, bastante exigente requerendo, logo à partida, o poder ser. A M. Hermann falhava, provavelmente, dois terços do mínimo exigível para ser emotivo. E isso porque a emotividade tem graus, podendo o indivíduo ser, pelo menos, pouco emotivo, emotivo ou muito emotivo. M. Hermann estaria, na melhor das hipóteses, no patamar abaixo do indivíduo pouco emotivo. M. Hermann carecia para ser uma pessoa emotiva de quantidade de sentimentos correspondente. Em certa ocasião fez notar isso aos que o rodeavam e que não percebiam a sua natureza, nomeadamente a sua amiga Hanna C, ela uma criatura muito emotiva que não entendia a incapacidade de M. Hermann de se emocionar.
Talvez devido à sua indigência emocional (ou por outra razão menos evidente e pelo que foi dito agora a despropósito) durante anos M. Hermann nunca chorou. Isto embora, em algumas ocasiões, tivesse tido motivos para isso. Em situações muito numerosas até. E a quantidade, também, tem relação com as vezes que se chora sendo esta uma razão evidente para isso e pelo que foi dito sem vir agora a despropósito. Como quando partiu as duas pernas, lhe desapareceram todas as bagagens no aeroporto, ou lhe faleceu um amigo de infância. A certa altura M. Hermann, inexplicavelmente, começou a chorar e só parou decorridos três dias. Não percebeu porquê. Nem ninguém. Especialmente Hanna C., ela sim, uma pessoa emotiva. Afinal tinha acabado de receber o reembolso do IRS.





Chefe é chefe

12 03 2007

Hanna C. ansiava por ser chefe. Não tinha, no entanto, qualidades suficientes para isso uma vez que essa é uma função exigente em atributos. Faltavam-lhe, pelo menos, um quarto das características necessárias para chefiar.
Para chefiar são necessárias várias qualidades, ao contrário de ser chefiado cuja principal característica imprescindível é ser obediente.
Hanna C. respeitava os chefes e obedecia-lhes sem os questionar. Depositava neles grande confiança. Percebe-se por isso que possuía a principal propriedade para ser chefiado: ser obediente. Faltavam-lhe, porém, os elementos importantes para ser chefe. Demorou 5 anos a adquiri-los. Durante esse período nunca deixou de ser obediente. Se não o tivesse sido teria demorado 15 anos.





A utilidade dos horários

8 03 2007

Hanna C. ligou a televisão à hora indicada mas o seu programa favorito tinha começado 15 minutos antes. No dia seguinte sucedeu o mesmo só que o intervalo entre a hora marcada e o horário de início era de 8 minutos.
Volvida uma semana o intervalo era de 60 minutos. Passados seis meses o intervalo entre a hora marcada e o horário de início era de cinco dias.
Devido às alterações Hanna C. começou a ver mais televisão pois tinha mais tempo para acompanhar mais séries. Passou a acompanhar 4 séries, a ver diariamente 2 documentários, um filme e 4 noticiários uma vez que o intervalo entre a hora marcada e o horário real de início dos programas o permitia.
No mês seguinte mudaram a grelha televisiva. Na primeira semana todos os horários foram cumpridos na íntegra. Na segunda havia uma oscilação de 5 minutos antes da hora marcada para o programa, durante a semana, e 11 minutos depois no fim-de-semana. Na terceira 2 minutos antes da hora marcada, durante a semana, e 1 minuto depois no fim-de-semana. Na semana seguinte nova variação. Hanna C. não percebia a lógica dos horários e começou a ouvir rádio.





Vender é vender

6 03 2007

Hanna C. (casada com C. Khunz) era vendedora. Vendia muitas coisas. Mas sempre objectos, nunca serviços. Especializara-se em coisas e não acções por serem menos exigentes.
Percebeu que mais que vender objectos lhes vendia as propriedades, nomeadamente volume e funções. Vendeu, por exemplo, caixas para guardar alimentos no frigorífico. Reparou que as pessoas as escolhiam tendo em atenção a cor, tamanho e capacidade hermética. Vendeu, depois, carros. Verificou que as pessoas os compravam tendo em consideração a potência e o modelo. Em todas as vendas o comprador tinha, também, em atenção relações: qualidade/preço; necessidade/dinheiro disponível; utilidade/urgência.
Com os anos Hanna C. concluiu que vendia volumes, funções e relações. Por essa razão era-lhe indiferente o produto. Vender é vender.





Dietas e saltos altos

2 03 2007

Hanna C. tinha uma amiga que teve uns problemas de saúde e foi ao médico. O médico, especialista em especialidades muito especiais, depois de a auscultar e pesar disse-lhe que ela tinha demasiado peso para a sua altura. Faltavam-lhe 5 centímetros para que o seu peso fosse o ideal. A amiga de Hanna C. escutou o médico, especialista em especialidades muito especiais, e ficou preocupada por apenas cinco centímetros não ser saudável. A amiga de Hanna C. tinha, porém, outra dificuldade. Não gostava de dietas. Por essa razão comprou uns sapatos de salto alto. Passou a ter a altura ideal para o seu peso.
Outra amiga de Hanna C. não se sentindo bem, em certa ocasião, consultou o mesmo médico, especialista em especialidades muito especiais, consultado pela amiga de Hanna C.. O médico, especialista em especialidades muito especiais, que tinha tratado a outra amiga de Hanna C. achou que, também, aquela sua amiga possuía peso a mais para alguém do seu tamanho. Também esta amiga de Hanna C. não gostava de dietas. Hanna C. que era daquelas pessoas que são amigas da sua amiga apresentou as duas. A amiga que primeiro tinha recorrido ao médico especialista em especialidades muito especiais contou-lhe dos saltos altos. A amiga de Hanna C. que, também, não gostava de dietas seguiu o conselho. Tem hoje 2 metros e 25 centímetros.